segunda-feira, 31 de janeiro de 2011

A questão da morte


        A morte é um tabu. Na sociedade ocidental dos dias de hoje, a morte nunca é o assunto da mesa, nem se comenta, lembra, fala sobre sua existência. De fato as pessoas só se dão conta da sua existência quando finalmente alguém morre. Mas a morte não é somente esquecida, ela é terrivelmente temida pela maioria das pessoas. Todos nós fazemos de tudo para que ela nunca chegue. A ciência, biologia, medicina, etc, fazem de tudo para prolongar a vida do individuo e sabemos que hoje, com o avanço dessas áreas, a expectativa de vida de um ser humano está cada dia maior. Chegar aos oitenta anos, o que há duzentos anos era inimaginável, hoje em dia é quase certo. Porém, o que todos parecem querer omitir é o destino inevitável de cada ser humano. Não importa nada, todos morrem.
        O curioso é que a morte é algo natural. A morte faz parte. Se nasceu, pode ter certeza que vai morrer, essa é a única condição. Talvez pelas especulações de crenças religiosas sobre uma vida após a morte, e pelo fato de que ninguém nunca comprovou tal coisa, ou pelos sentimentos negativos ligados a ela, como medo, dor, esquecimento, solidão, as pessoas atrasam até não poder mais a hora morte e vivem como se ela nunca fosse chegar. Nesse momento nos me lembramos de Martin Heidegger quando fala em seu livro “Ser e Tempo” sobre uma das categorias do homem, que é “ser-para-a-morte”, e que somente poderemos viver uma existência própria quando nos apoderarmos da nossa morte. E isso é simplesmente recusar essa vida do “ainda-não”, esse esquecimento da morte e se apropriar da morte não só como possibilidade, mas também como certeza para todos nós.
        É justamente essa atitude inautêntica de esquecimento, medo e fuga da morte que é passada e incentivada na sociedade que vivemos. Todas as pessoas que destoam desse modo de vida são tratadas da mesma forma, são temidas, esquecidas, julgadas. O suicídio nunca, absolutamente nunca é tratado pelas mídias, nem nas conversas de bar, nem nos jantares de família, nem no bate-papo dos amigos. Essa é a forma de morte mais abafada pelas pessoas. Isso é interessante, pois há estudos que mostram que esse fenômeno acontece como forma de prevenção de suicídios, já que o suicídio em si é um ato de potencial contagiante.
        Para a sociedade não é interessante que as pessoas se suicidem. O “sistema” atual quer e precisa que todos continuem produzindo e, mais importante, continuem consumindo. Como forma de controle desse suicídio “contagioso”, simplesmente se omite a sua ocorrência. E, mais abrangente do que isso, se procura omitir o próprio assunto “morte”.
        Essa conclusão é perfeitamente aceitável do ponto de vista lógico, porém nos leva a perguntar se somos realmente donos de nossa própria vida. Ou até se somos donos de nossa própria morte. O suicídio é um fenômeno extremamente interessante justamente porque evidencia aquele individuo como dono de sua própria morte. Aquilo que é dispensado por todos, abdicado, é justamente aquilo que o suicida reivindica: a sua morte.

Por: Maria Clara T. de Assis

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